Estudo do Banco Mundial constatou que o Brasil, apesar de ter número de servidores públicos “modesto”, tem gasto de pessoal “alto” porque a remuneração das carreiras públicas tende a ser maior que as carreiras privadas. Além da questão previdenciária, o estudo aponta a necessidade de rever: a) alto salário de entrada, b) a progressão muito rápida e c) o número excessivo de carreiras. Como servidor público de uma carreira relativamente privilegiada, concordo com essas conclusões: além de ser a favor da reforma da previdência que vai adiar minha aposentadoria em pelo menos 5 anos e reduzir meu salário líquido em quase 5%, reconheço que subimos rápido demais na carreira: com 37 anos, já tive todas as promoções e terei direito a apenas uma progressão, ou seja, passarei a maior parte da minha vida no topo da carreira. Economistas liberais e o governo têm usado o estudo de maneira bastante desonesta, dando a entender que o aumento na despesa com funcionalismo tem sido contínuo nos últimos anos:
- Como já publiquei no meu Blog, no governo Lula, a despesa com funcionalismo da União (ativos, inativos e pensionistas, civis e militares) caiu de 4,8% para 4,3% do PIB. A escolha do ano de 2008 para o início das séries não é aleatória: aquele foi o ano em que a despesa com funcionalismo atingiu o menor valor de todo o governo Lula;
- O governo Dilma (jan/11 a mar/16) foi rígido com funcionalismo e os dissídios da maioria das carreiras ficaram abaixo da inflação. Como a despesa com funcionalismo também depende da evolução funcional, de aposentadorias e de abertura de concursos, em todo seu governo, a despesa real com funcionalismo aumentou menos de 2%, diminuindo a despesa de pessoal para 4% do PIB;
- Economistas liberais e os que hoje estão no governo foram entusiastas defensores do impeachment insistem em ignorar os custos de oportunidade dessa escolha política: além da paralisia legislativa que contribuiu para agravar a crise econômica, a campanha de Temer à presidência teve de angariar apoio entre diversos grupos, como o funcionalismo federal. Em menos de 3 anos de governo Temer, diversas categorias foram agraciadas com reajustes muito acima da inflação e, mesmo quase sem realizar concursos, a despesa de pessoal aumentou 8% em seu governo, sem contar reajustes que passaram a valer neste ano;
- A reforma administrativa proposta pelo governo é para Executivo e o próprio estudo do Banco Mundial admite que: “A decomposição dos gastos federais com pessoal mostra que, apesar de os gastos totais serem estáveis, as despesas com pessoal do Poder Judiciário tiveram um crescimento expressivo”. Aliás, mesmo com o aumento do teto constitucional, as despesas com auxílio moradia continuam altas;
- Leio na imprensa que o governo estuda efetivar servidor depois dele ser trainee por dois anos. Alguém pode contar para o Ministro da Economia que o estágio probatório já existe e desde o governo FHC dura três anos.
Vocês querem reforma administrativa? Eu também quero, mesmo que individualmente ela me prejudique. Só que sou bem cético quanto a isso pelas seguintes razões: a) Economistas liberais, entusiastas do impeachment, precisam fazer autocrítica e admitir que tiraram um governo que estava fazendo ajuste fiscal e colocaram um governo que cumpriu promessa de conceder aumentos expressivos para funcionalismo; b) Sucessivas entrevistas do Ministro da Economia deixam claro que ele não conhece orçamento, administração pública e Direito Administrativo. Não tem como sair boa coisa com embasamento técnico tão ruim; c) Será que o governo eleito por causa da Lava Jato terá coragem de enfrentar os privilégios do Poder Judiciário em sentido amplo? Duvido. Polícia Federal e Militares, dois setores da burocracia muito próximos do presidente, passarão praticamente incólumes da reforma da previdência.
http://documents.worldbank.org/curated/en/449951570645821631/pdf/Gest%C3%A3o-de-Pessoas-e-Folha-de-Pagamentos-no-Setor-P%C3%BAblico-Brasileiro-o-Que-Os-Dados-Dizem.pdf
Já tinha visto outro estudo do Banco Mundial, achei um tanto simplista e as reportagens que vemos estão bastante enviesadas.
Tenho algumas dúvidas e questionamentos. Vamos por partes:
1) Nossas leis orçamentárias consideram gasto de pessoa = ativos + inativos. O estudo do banco mundial considerou isso?
2) Falar que o servidor ganha o dobro de uma pessoa com a mesma qualificação no setor privado é um pouco complexo, porque diploma não é sinônimo de responsabilidade. Um delegado da PF, por exemplo, tem graduação em Direito, mas será que é sensato comparar um delegado com um bacharel de Direito? O delegado é responsável por diversos servidores, é algo similar a uma função gerencial, não? Será que um analista do BACEN, cargo que você exercer, é uma função de complexidade e responsabilidade média ou superior ao mercado?
3) Dizem que foi o crescimento de gastos em folha que quebrou o setor público, mas pelo tesouro transparente esses gastos se demonstram bem estáveis, o que explodia foram os gastos de previdência e agora querem botar a culpa da má gestão da coisa pública toda nas costas do servidor. Só eu tenho essa impressão?
http://www.tesourotransparente.gov.br
Minhas ponderações:
1) Falar em treine de 2 anos chega a ser ridículo o tamanho do desconhecimento da máquina pública desse governo, os caras não conhecem o estágio probatório rsrs.
2) Retirar a estabilidade para novos servidores é algo que não faz sentido, a CF já regula muito bem hipóteses para controle de gastos públicos, permitindo demissão de servidores estáveis para o controle de gasto de pessoal, só que isso não é colocado em prática. Sinceramente penso que essa retirada é mais maléfica do que benéfica.
3) Alguns jornais divulgaram a informação de que 44% dos “servidores do setor público” ganham mais de R$ 10.000,00.
Agora vamos aos fatos. O total de servidores públicos no Brasil (sem contar os empregados públicos) é de aproximadamente 11,4 milhões, assim divididos, 6,5 milhões (57%) nos municípios, 3,7 milhões (33%) nos estados e 1,2 milhões (10%) na União.
Vale dizer, a maioria esmagadora dos servidores (57%) tem vínculo com os 5.570 municípios brasileiros. São principalmente professores primários, auxiliares de escolas e creches, merendeiros, auxiliares de serviços gerais, auxiliares de enfermagem, enfermeiros e congêneres, que na sua maioria têm remuneração inferior a R$ 2.000,00. Os estados estão em situação similar aos municípios.
4) Por razões óbvias a disparidade salarial será menor nos estados e municípios, a União concentra servidores cujas atribuições são também mais complexas, como analistas do BACEN, magistrados, auditores da RF, órgãos de controle e regulamentação, professores universitários. Já os estados também possuem gastos de pessoal bastante altos pois concentram professores e militares, que se aposentam rápido e também demandam um alto efetivo.
5) Adoram falar dos EUA, mas isso ninguém mostra:
https://www.govexec.com/pay-benefits/2015/10/feds-earn-78-more-private-sector-workers-study-finds/122586/
6) Dos 5-8% do PIB com juros da dívida ninguém fala, ninguém tem proposta para reduzir esse custo monstruoso que cedo ou tarde serão pagos com dinheiro de impostos, ou seja, todo o sacrifício vai pra pagar esses juros monstruosos.
7) Sendo pragmático, reduzir os salários das carreiras de elite para os padrões do ES (inicial de 10~12k, com 25 anos pra chegar no topo) e principalmente das carreiras “mais simples e meramente administrativas” pois representam a grande massa do serviço público e mesmo executando atividades mais simples possuem uma média salarial bem alta (~12k). Acho que seria uma proposta bem realista, porque uma alteração ao molde vampirão (5 mil inicial) todos sabemos que não vai passar nunca. O grande ajuste em termos salariais está em congelar salários por alguns anos, não adianta reduzir iniciais e continuar dando reajustes, já que a grande massa de servidores será composta dos atuais ativos e inativos, qualquer coisa diferente disso é botar o bode na sala e fugir do problema.
Obrigado pela paciência de ler isso tudo, forte abraço kkkkk.
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