Instrumentos para mitigar a sobrevalorização cambial

Em 2016 o real teve expressiva valorização frente ao dólar. Segundo o Banco Central do Brasil (BCB), entre dezembro de 2015 e julho de 2016, a taxa efetiva de câmbio teve valorização de quase 20%. Por essa razão, não é de se surpreender que alguns empresários tenham manifestado preocupações com o risco de que, após confirmação do impeachmet, o real se aprecie ainda mais[1]. As principais consequências de uma sobrevalorização do real podem assim ser resumidas:

– Empresas e bancos endividados em dólares são beneficiados: segundo dados preliminares do BCB, em julho de 2016 a dívida externa privada era de USD 261,3 bilhões, redução de 4,3% em relação ao final de 2014. Com a apreciação cambial, a dívida em reais diminui;

– O saldo em transações correntes tende a diminuir: entre 2015 e maio de 2016, o saldo em transações correntes teve expressiva melhora, chegando a ser superavitário em abril e maio. Essa tendência foi revertida em junho, quando o déficit em transações correntes foi de USD 2,5 bi e aprofundada em julho, quando o déficit em transações correntes foi superior a USD 4 bilhões. Como é amplamente conhecida na literatura econômica a defasagem entre taxa de câmbio e saldo de transações correntes, é provável que a apreciação cambial já tenha começado a afetar negativamente o saldo em transações correntes;

– A receita líquida com swaps cambiais tende a aumentar: entre janeiro e 22 de julho de 2016, o BCB teve arrecadação líquida de R$ 73,7 bilhões, revertendo parcialmente as perdas de R$ 113,3 bilhões entre 2014 e 2015. Se por um lado isso contribui para diminuir a carga de juros da dívida pública, de outro aumenta a dívida líquida do setor público (DLSP, pois a União é credora líquida externa (a dívida externa pública é inferior ao montante das reservas). Entre dezembro de 2015 e junho de 2016, a DLSP aumentou de 36,2% para 42% do PIB no primeiro semestre deste ano;

– Alivia a situação financeira de entes subnacionais que tomaram empréstimos externos, como o governo de Minas Gerais.

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Fonte: BCB

No curto-prazo, o impacto sopre atividade econômica é ambíguo. De um lado, como desde 2015 o saldo externo tem sido praticamente a única contribuição positiva para o crescimento do PIB, a apreciação cambial tende a ter efeitos contracionistas sobre o nível de atividade. De outro, a melhora da posição patrimonial de empresas endividadas em dólares aumenta os lucros e arrecadação tributária. A recente diminuição do saldo em transações correntes pode indicar que a recente apreciação do real tornou a moeda sobrevalorizada. Também pode indicar recuperação do nível de atividade e sinais de que o fim da recessão está próximo. Mais provável que seja resultado das duas coisas.

De qualquer modo, se a tendência de apreciação cambial continuar, é possível que o país ingresse em um novo período de sobrevalorização cambial, endividamento externo e desindustrialização. No curto prazo, a melhoria da situação patrimonial privada e a queda na despesa com juros da dívida pública pode resultar em algum dinamismo econômico. Mas no médio prazo, a insustentabilidade do déficit em transações correntes pode levar a outra maxidesvalorização cambial, com impactos negativos mais que conhecidos. Neste sentido, é necessário algum grau de intervenção para evitar a (excessiva) sobrevalorização do real.

No mês de agosto, o BCB tentou aumentar as intervenções no mercado de dólar futuro para limitar a apreciação cambial, com aumento a ração diária de swaps cambiais reversos de USD 500 milhões para USD 750 milhões. Devido à ineficácia da medida, em poucos dias o BCB voltou a ofertar diariamente USD 500 milhões em swaps reversos. Trata-se de um arsenal limitado: em 24 de agosto o estoque de swaps cambiais era de USD 42,6 bilhões. Tendo em vista que boa parte desses contratos vencem nos próximos meses e intervenções diárias de USD 500 milhões, é de se esperar que o estoque de swaps cambiais seja zerado em meados de novembro deste ano.

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Fonte: BCB

Uma vez esgotados os estoques de swaps cambiais, o BCB poderia adotar as seguintes estratégias de intervenção no mercado de câmbio:

– Comprar dólares à vista, aumentando o nível das reservas, que em 23 de agosto totalizavam USD 378 bilhões;

– Atuar no mercado futuro por meio da oferta de swaps cambiais reversos;

O problema das duas primeiras estratégias é o custo fiscal. No caso das reservas, o custo de carregamento é dado pela diferença entre as taxas de juros dos títulos públicos norte-americanos e as taxas de juros da dívida pública brasileira. Já a emissão de swaps reversos em conjuntura na qual há tendência de apreciação cambial aumenta a probabilidade de que ocorram elevadas despesas líquidas com esses derivativos, o que tende a agravar a já precária situação das contas públicas.

Restaria ao BCB diminuir a taxa Selic para desestimular a entrada de capitais. De um lado, isso diminuiria a remuneração dos títulos públicos corrigidos diretamente pela Selic. De outro, tenderia a aumentar as expectativas de inflação e de juros futuros, encarecendo os juros pré-fixados. Neste sentido, reduções marginais da Selic – como as que o mercado prevê que irão ocorrer a partir do final de 2016 – não tendem a afetar significativamente o custo da dívida pública. Diante disso, é pouco provável que o BCB consiga sozinho evitar uma nova rodada de sobrevalorização cambial. Algumas alternativas seriam:

– Igualar as alíquotas de imposto de renda de residentes e não residentes para aplicações em renda fixa (como títulos da dívida pública), o que desestimularia aplicações de curto-prazo feita por não residentes;

– Instituir alíquotas não nulas de IOF para aplicações de curto-prazo feitas por não residentes nos mercados financeiros e de capitais;

– A realização de um expressivo ajuste fiscal, o que permitiria ao BCB ter uma política monetária mais flexível;

– O Conselho Monetário Nacional (CMN), composto pelo presidente do BCB e pelos Ministros da Fazenda e do Planejamento, alterar a meta de inflação para 2017 e 2018, tolerando que o BCB persiga um nível de inflação mais elevado no curto-prazo para que uma queda mais expressiva da Selic seja possível;

As duas primeiras alternativas, além de não terem sido citadas por nenhum membro da equipe econômica, possuem o inconveniente de encarecer a dívida pública. Embora presente no discurso da equipe econômica, é pouco provável que ocorra um ajuste fiscal expressivo, pois as sinalizações do governo interino foram no sentido de um relaxamento fiscal e, após impeachment, o legislativo estará esvaziado por conta das eleições municipais seguidas do recesso de fim de ano. Por fim, o novo presidente do BCB e o ministro da Fazenda sinalizaram que irão perseguir a meta de inflação de 4,5% já no ano que vem. Por essa razão, é improvável que a atual sobrevalorização cambial seja revertida. Espera-se que pelo menos as empresas brasileiras aproveitem essa janela de oportunidade para reduzir o grau de endividamento externo.

[1] http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2016/08/1806709-empresarios-pedem-para-temer-segurar-dolar-a-r-320.shtml

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Sobre a suposta indústria da multa paulistana

Um assunto recorrente no município de São Paulo é sobre a suposta existência de uma “indústria da multa”, pois em 2015 a arrecadação com multas superou R$ 1 bilhão. Em primeiro lugar, praticamente todos os valores relativos ao município de São Paulo são superlativos. Entre eles, podemos citar a população de quase 12 milhões de habitantes, maior que a de diversos países, e a arrecadação, 5º maior entre os entes federativos brasileiros, ficando atrás apenas da União e dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Outro aspecto relevante é que diversas grandezas econômicas, como arrecadação, preços, número de automóveis e Produto Interno Bruto (PIB) possuem tendência de aumento. Ou seja, a afirmação de que a arrecadação com multas aumentou em termos nominais e atingiu valor expressivo pode significar apenas que o município de São Paulo é grande e houve aumento do número de veículos e inflação no período.

Na tabela abaixo, com valores disponibilizados no site da própria Prefeitura do Município de São Paulo (PMSP), pode-se observar que, com exceção de 2008, a arrecadação nominal com multas de trânsito aumentou todos os anos. Isso não diz muita coisa, pois no mesmo período as receitas correntes nominais aumentaram ininterruptamente e houve inflação em todos os anos:

R$ Multas de trânsito Receitas Correntes IPCA acumulado de dez/xx a jul/16 (%)
2005

350.587.217,69

14.758.019.494,46 86,8%
2006

391.036.437,80

17.333.426.274,12

81,2%

2007

391.854.741,59

19.443.502.772,03 73,4%
2008

386.062.983,84

23.281.544.070,09

63,8%

2009

492.914.883,79

24.255.376.106,40

57,0%

2010

556.131.397,74

27.677.834.690,31

48,2%

2011

747.738.243,87

31.581.999.236,50

39,2%

2012

819.315.656,89 34.850.688.704,29

31,5%

2013

850.531.864,13 37.710.663.491,90

24,2%

2014

899.556.116,79

40.699.086.092,32

16,7%

2015

1.016.064.080,95

46.975.994.189,41

5,4%

Fonte: PMSP[1] e IBGE

Um primeiro exercício, já realizado pela PMSP, foi calcular a arrecadação real das multas, após correção monetária. Como se pode observar no Gráfico 1, a arrecadação real de multas manteve-se relativamente constante entre 2005 e 2008, teve aumento expressivo entre 2009 e 2011, portanto na administração anterior, e se manteve relativamente constante desde então:

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Outra forma de se avaliar a existência da “indústria da multa” é pela relevância das multas na arrecadação do município. Como se pode observar no Gráfico 2, em 2005 as multas representavam 2,38% das receitas correntes, perdendo participação relativa até 2008. De 2008 para 2011, a receita de multas aumenta mais rapidamente que a arrecadação e, desde então, as multas têm perdido participação relativa na arrecadação da PMSP, representando, em 2015, 2,16% das receitas correntes. O gráfico 2 também demonstra que as multas representam parcela pequena, entre 1,66% (2008) e 2,38% (2005) das receitas do município.

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Como desde 2011 o valor real arrecadado com multas tem sido relativamente constante, as multas representam menos de 2,5% das receitas correntes do município e, desde 2012, têm perdido participação relativa na arrecadação municipal, é um exagero afirmar que existe uma indústria da multa. Mesmo se ela houvesse, evitar multas é bastante simples: basta respeitar as normas de trânsito, como observar limites de velocidade e não atravessar no sinal vermelho.

[1] http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/financas/contaspublicas/index.php?p=3216

Sobre a desvinculação de receitas de estados e municípios com educação: um risco para universalização da educação básica, pouco eficaz como medida de ajuste fiscal

A Constituição determina que 25% dos impostos deve ser destinada à manutenção de desenvolvimento do ensino – infantil e fundamental no caso dos municípios e, para os estados, fundamental e médio. Para permitir que entes federativos com baixa arrecadação de impostos tenham como destinar recursos para a educação, na década passada foi criado FUNDEB (sucessor do FUNDEF), fundo constituído por percentual dos impostos da União, estados e DF e repartido por estados e municípios de acordo com o número de alunos das redes públicas de educação básica. Isso tem contribuído para a progressiva expansão das redes de ensino infantil e médio, bem como expansão do ensino integral no ensino fundamental, que já se encontra universalizado. Ainda assim, poucos municípios conseguiram universalizar a pré-escola (etapa de ensino obrigatória) e as creches (embora não obrigatórias, os municípios devem disponibilizar vagas para quem precisar), e a maioria dos estados ainda não universalizou o ensino médio, um indício de que a vinculação de recursos para a educação básica ainda é insuficiente.

A falta de creches também afeta trabalhadores de baixa renda, especialmente mulheres, que não têm com quem deixar as crianças enquanto trabalham. Como neste ano há eleições municipais, é de se esperar que a fila de espera para vagas em creches seja um dos temas mais importantes a serem tratados pelos candidatos. O déficit de vagas em creches foi tema do debate entre candidatos à PMSP e de uma declaração de Freixo, candidato do PSOL à prefeitura do Rio de Janeiro. Segundo as próprias secretarias municipais de ensino, em São Paulo havia uma fila de 103,5 mil vagas em creches e de 3,4 mil em pré-escolas em junho de 2016[1]. No Rio do Janeiro, o déficit é de 25,5 mil vagas em creches[2]. Em 2014 e 2015, os dois municípios gastaram com educação mais que o mínimo constitucional.

O fato da fila por vagas nas creches municipais do Rio de Janeiro ser de aproximadamente um quarto da fila em São Paulo é um dado surpreendente, pois a população do município do Rio de Janeiro (6,5 milhões) é pouco maior que a metade do município de São Paulo (12 milhões), segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Três hipóteses para isso seriam: diferenças de fecundidade, maiores gastos recentes para a diminuição do déficit de vagas ou um esforço educacional no passado que tenha legado ao Rio de Janeiro uma rede pública de educação infantil mais abrangente que a de São Paulo.

Embora não existam dados recentes sobre a fecundidade nos municípios, segundo o IBGE Rio de Janeiro e São Paulo estão entre os estados com menor taxa de fecundidade (1,6 filho por mulher)[3], indicando que a demanda relativamente menor no Rio de Janeiro provavelmente não decorra da fecundidade.

No município de São Paulo houve expansão de quase 100 mil vagas no ensino infantil desde 2013, o que só foi possível por gastos com educação significativamente maiores que o mínimo constitucional: no primeiro semestre de 2016, 34,1% dos impostos foram gastos com educação, contra 29,55% em 2015 e 28,69% em 2014[4]. Além de aumentar os gastos com manutenção e desenvolvimento do ensino, a PMSP tem deixado de usar as despesas com inativos da educação no cômputo do atendimento do mínimo constitucional: a partir de 2013, há retirada anual de 20% das despesas com inativos da educação, de modo que, a partir de 2018 o atendimento ao mínimo constitucional deixará de levar em conta as despesas com inativos. Já município do Rio de Janeiro destinou à educação percentual dos impostos significativamente menor que São Paulo:  no primeiro semestre de 2016, 21,82% dos impostos foram destinados à manutenção e desenvolvimento do ensino[5], contra 25,82% em 2015[6] e 25,42% em 2014[7]. Mesmo gastando menos, a pressão sofrida pelo município para expandir as vagas de ensino infantil é significativamente menor.

A comparação entre o número de matrículas também afasta a última hipótese. Segundo o município de Rio de Janeiro, há 68,3 mil matrículas nas creches e 83 mil matrículas em pré-escolas municipais ou conveniadas com o município[8]. Na PMSP, somando-se a rede direta e conveniada, havia 277,9 mil matrículas em creches e 215,1 mil matrículas em pré-escolas em junho de 2016. Ou seja, a despeito do número de matrículas nas creches municipais paulistanas ser 4,1 vezes o do Rio de Janeiro, a demanda não atendida é 4,1 vezes a do Rio de Janeiro. Isso para uma cidade em que a população é menor que o dobro do Rio de Janeiro. Sem dúvidas, um dado intrigante.

 

 (Em milhares) PMSP PMRJ SP/RJ
Matrículas em creches 277,9          68,3             4,1
Matrículas em pré-escolas 215,1          83,0             2,6
Demanda creche 103,5          25,5             4,1
População total    11.967,0    6.476,0             1,8

Fonte: SME-SP, SME-RJ e IBGE

 

Inúmeros fatores podem explicar essa diferença: proporção de crianças em creches particulares, proporção de mulheres que trabalham fora de casa, propensão a recorrer a cuidadoras e migração. Isso também é um indício de que, conforme mais vagas forem criadas, famílias que não estavam cadastradas na fila de demanda passem a buscar uma vaga[9].

O que impressiona é que São Paulo e Rio de Janeiros são municípios com perfis demográficos, de renda e arrecadação bastante similares (Rio de Janeiro é um pouco mais pobre) e, ainda assim, a demanda por creches públicas é significativamente diferente. Isso demonstra a importância de mecanismos de repartição e vinculação de tributos como o FUNDEB, que deveria se tornar permanente, pois o FUNDEB foi introduzido por emenda nos ADCTs e, se não for renovado, deixará de existir na próxima década.

Neste sentido, estender a desvinculação de receitas aos estados e municípios, independentemente de atenderem à oferta de vagas no ensino infantil (municípios) e médio (fundamental), é um risco à progressiva universalização do ensino básico. Isso permitiria que entes federativos que não oferecem vagas para todas as pessoas reduzam despesas em educação, o que vai na contramão de um desenvolvimento equilibrado que promova igualdade de oportunidades. Quem acompanhou este artigo até aqui pode argumentar que a emenda constitucional é importante devido à rigidez de despesas públicas. De fato, a rigidez de despesas públicas é um problema grave, mas ela se deve às despesas obrigatórias e despesas irredutíveis (como vencimentos de servidores públicos), não à vinculação de 25% dos impostos com educação e 15% com saúde[11]. Por essa razão, é de se comemorar que a Emenda Constitucional 93, de 8 de Setembro de 2016, tenha preservado as vinculações de receitas com educação e saúde.

* A versão original do artigo foi escrita antes da promulgação da Emenda Constitucional 93/16 de partida de uma premissa equivocada de que a desvinculação de receitas seria aplicável aos mínimos constitucionais em educação e saúde.

[1] http://portal.sme.prefeitura.sp.gov.br/Main/Noticia/Visualizar/PortalSMESP/Demanda-Escolar

[2]http://aosfatos.org/noticias/freixo-afirma-que-42-mil-criancas-estao-fora-das-creches/

[3] http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv66777.pdf

[4]http://www.tcm.sp.gov.br/relatorios/AnualFiscalizacao/RAF%202015.pdf http://www.tcm.sp.gov.br/relatorios/AnualFiscalizacao/RAF%202014v2.pdf http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/upload/Educacao_3Bim_1469649267.pdf

[5] http://www.rio.rj.gov.br/dlstatic/10112/6305891/4166556/RREOAnexo8.pdf . Não se pode dizer que a PMRJ descumpre a Constituição, pois os 25% dizem respeito ao ano calendário.

[6] http://www.rio.rj.gov.br/dlstatic/10112/5896476/4158511/RREOReceitaseDespesasdoMDE.pdf

[7] http://www.rio.rj.gov.br/dlstatic/10112/5189438/4135276/RREOanexo8.pdf

[8] http://www.rio.rj.gov.br/web/sme/educacao-em-numeros

[9]https://bianchiniblog.wordpress.com/2016/04/08/apesar-do-aumento-recorde-de-matriculas-na-rede-municipal-de-educacao-infantil-o-debate-sobre-a-administracao-haddad-e-centrado-nas-ciclovias/

[10]http://g1.globo.com/politica/noticia/2016/08/senado-aprova-em-primeiro-turno-pec-que-prorroga-dru-ate-2023.html

[11] http://www.conjur.com.br/2016-mai-17/contas-vista-vinculacoes-orcamentarias-gastos-obrigatorios

Avaliação preliminar sobre o governo interino nas políticas monetária e cambial

A) Política monetária

O governo interino mudou a presidência e algumas diretorias do Banco Central do Brasil (BCB), sendo possível verificar algumas modificações nas políticas monetária e cambial. A primeira mudança foi da forma de comunicação institucional a respeito das reuniões e decisão do Comitê de Política Monetária (COPOM)[1], algo que foi bem recebido pelo mercado por tornar mais clara a atuação da autoridade monetária.

A segunda mudança foi uma sinalização inequívoca de que a nova composição do COPOM teria uma postura mais rigorosa com a inflação, mantendo a meta da taxa de Selic em 14,25% por mais tempo do que era esperado. No Boletim FOCUS, isso se traduziu em um aumento na meta da taxa Selic esperada para o final de 2016, de 13,25% (29/4) para 13,50% ao ano (29/7). A expectativa de IPCA para 2016 aumentou de 6,94% para 7,20%, consequência direta da inflação acima da esperada em abril e maio – nos dois meses, o IPCA acumulado foi de 1,39%, 0,28% acima da mediana dos analistas de mercado em 29/4. Como a política monetária tem defasagem de 9 (nove) meses[2] e a mudança na cúpula do BCB ocorreu em maio, o efeito da nova composição do COPOM sobre as expectativas de inflação deve ser verificado nas previsões para 2017. A diferença é expressiva: o IPCA esperado para 2017 caiu de 5,72% para 5,20%. A combinação de queda da inflação e aumento da Selic esperadas aumentou a taxa de juros real prevista para o início de 2015 em 0,77%. Finalmente, o mercado comprou a tese de que a política monetária mais rígida no curto-prazo será mais eficaz no longo-prazo: para o final de 2017, a previsão da taxa Selic saiu de 11,75% para 11,00%.

Quadro 1: Expectativas de juros e inflação

Boletim FOCUS

IPCA

Selic

2016 2017 2016 2017 Taxa real (2017)
Final de abril[3] 6,94% 5,72% 13,25% 11,75% 7,12%
Final de julho[4] 7,20% 5,20% 13,50% 11,00% 7,89%

 

B) Política cambial

Entre o início de junho de 2013 e o final março de 2015, o BCB ofertou swaps cambiais, que passaram de zero para USD 115 bilhões. A oferta de swaps cambiais podem ser tanto um instrumento de intervenção na taxa de câmbio, quanto um meio de ofertar hedge para agentes endividados em dólares. Em 2013 predominou a primeira função e, em 2015, a última.

A partir de março de 2016, o real passou a se apreciar significativamente, levando o BCB a diminuir o estoque de swaps no intuito de limitar a apreciação do real. De fato, entre 22/3 e 19/5, o estoque de swaps cambiais foi reduzido de USD 108,1 bilhões para USD 62,1 bilhões, mantendo o dólar comercial a R$ 3,60.

De 20/5 ao final de junho, já sob o governo interino, o BCB deixou de atuar no mercado de swaps e o resultado foi uma apreciação do real para R$ 3,21 por dólar. Desde então, o BCB vem reduzindo o estoque de swaps cambiais em ritmo mais lento que o ocorrido entre março e maio: em 3 de agosto, o estoque de swaps era de USD 51,6 bilhões e o dólar estava cotado a R$ 3,27. É bastante provável que a recente rodada de apreciação do real tenha contribuído para a queda das expectativas de inflação.

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Fonte: BCB

Embora a recente queda do dólar seja parte de um movimento global, o real está entre as moedas que mais se apreciaram no período, o que resultou em expressiva queda da taxa de câmbio efetiva, que se encontra no mesmo patamar do lançamento do Plano Real e do final de 2008, como se observa no Gráfico 2. Por essa razão, há quem entenda que o real se encontra sobrevalorizado, o que teria efeitos negativos sobre a competitividade externa brasileira[5].

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Fonte: BCB

C) Impactos fiscais

Apenas 28% da dívida mobiliária federal é pré-fixada. Outros 26% são corrigidos por índices de preços, 20% é atrelada à Selic e 25% são operações de mercado aberto realizadas para que a Selic fique próxima da meta. Por essa razão, o impacto de altas marginais na taxa Selic é incerto: embora encareçam os títulos indexados à Selic e as operações de mercado aberto, tendem a baratear os títulos pré-fixados e os indexados a índices de preços[6]. De fato, embora o mercado tenha aumentado a expectativa para a taxa Selic, a taxa implícita da dívida líquida do setor público, excluídos os resultados com swaps caiu de 24,81% nos 12 meses encerrados em abril para 24,28% nos 12 meses encerrados em junho (Gráfico 3).

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Fonte: BCB e IBGE

A recente rodada de apreciação cambial teve outro efeito: a reversão do resultado com swaps. Em 2015, o prejuízo com swaps foi de R$ 102,6 bilhões, enquanto no primeiro semestre de 2016 houve superávit de R$ 78,7 bilhões. Mesmo que a taxa de câmbio volte a ficar em torno de R$ 4 por dólar, o prejuízo com swaps de 2015 não irá se repetir, pois atualmente o estoque de swaps é de USD 51,6 bilhões, menos da metade do que era no segundo semestre do ano passado. Por essa razão, a recente mudança de postura do COPOM contribuiu para reforçar a tendência que já existia no primeiro trimestre[7], de queda na carga da carga de juro da dívida pública.

Por outro lado, como a posição em swaps (USD 62,1 bilhões no final do primeiro semestre de 2016) é bastante inferior ao volume de reservas (USD 376,2 bilhões no final do primeiro semestre de 2016), a apreciação cambial ocorrida no primeiro semestre de 2016 aumentou a dívida líquida do setor público de 36,2% do PIB (dez/15) para 42,0% do PIB (jun/16).

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Fonte: BCB

Conclusões

Nos primeiros meses, a atual composição do COPOM já demonstra pelo menos três mudanças em relação à antiga composição:

– Comunicação mais clara e transparente;

– Sinalização de um combate à inflação mais rigoroso;

– Diminuição no ritmo de redução de swaps cambiais.

Até o momento, os efeitos foram os seguintes:

– Queda nas expectativas de inflação para 2017;

– Aumento na taxa Selic esperada para o final de 2016 e queda na taxa Selic esperada para final de 2017;

– Apreciação expressiva da taxa de câmbio, que muitos analistas entendem estar sobrevalorizada;

– Os impactos fiscais da apreciação cambial são a redução na despesa com juros em decorrência do aumento nos ganhos líquidos com swaps e aumento expressivo da dívida líquida do setor público;

– No curto-prazo, a apreciação cambial alivia a situação patrimonial das empresas endividadas em dólares;

– A combinação de aumento da Selic real e apreciação cambial tendem a exercer efeito contracionista sob a óptica da renda.

Nota: Embora o presidente interino tenha mantido a tradição de nomear servidores não efetivos apenas para a diretoria do BCB, nesta semana o BCB publicou Portaria incorporando o Decreto 8.821, de 26 de julho de 2016. A partir de agora, nomeações de chefes de departamentos (nível hierárquico imediatamente abaixo dos diretores) deverão ser solicitadas ao Ministro de Estado Chefe da Casa Civil da Presidência da República e nomeações de chefes adjuntos e chefes de divisão (níveis hierárquicos imediatamente inferiores aos diretores) deverão ser apreciadas pelo Ministro de Estado Chefe da Casa Civil da Presidência da República. Certamente, tal medida aumenta o risco de ingerência política sobre o BCB e vai na contramão da tendência de conferir autonomia aos bancos centrais.

[1] http://www.bcb.gov.br/pt-br/#!/c/notas/15722  e http://www.bcb.gov.br/pt-br/#!/c/notas/15721

[2] http://www.bcb.gov.br/ htms/relinf/port/2009/06/ri200906b8p.pdf

[3]http://www.bcb.gov.br/pec/GCI/PORT/readout/R20160729.pdf

[4] http://www.bcb.gov.br/pec/GCI/PORT/readout/R20160429.pdf

[5]http://www.valor.com.br/financas/4649459/fmi-ve-cambio-real-do-brasil-sobrevalorizado-em-relacao-fundamentos

[6] https://bianchiniblog.wordpress.com/type/aside/

[7] https://bianchiniblog.wordpress.com/2016/04/12/nos-primeiros-meses-do-ano-ha-sinais-de-que-o-deficit-publico-sera-menor-que-em-2015-mas-ainda-assim-em-patamar-insustentavel/