BC continua reduzindo exposição em swaps cambiais

Neste mês, o Banco Central do Brasil (BCB) deixou de rolar 43% dos contratos de swap que vencem na próxima segunda-feira. Com isso, a exposição líquida de swaps do BCB cairá para USD 17,8 bilhões, vincendos em maio (36%), junho (25%) e julho (39%). Trata-se do menor saldo desde o final de junho de 2013, mês em que o Banco Central começou a leiloar swaps cambiais em larga escala (Gráfico 1). Por essa razão, é de se esperar que, diferentemente dos dois anos anteriores, neste ano os swaps influenciem apenas marginalmente a carga de juros da dívida pública (Gráfico 2). No primeiro trimestre de 2017, os swaps resultaram em receita líquida R$ 5,6 bilhões, contra receita líquida de R$ 83,8 bilhões em 2016 e despesas líquidas de R$ 102,6 bilhões em 2015. Com isso, as taxas de juros da dívida pública dependerão fortemente da taxa Selic e da inflação (Gráfico 3), que estão em queda livre (Gráfico 4).

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Fonte: BCB (projeções para os próximos meses baseada nas datas de vencimento dos swaps, pressupondo que BCB não leiloe novos contratos, nem role os contratos vincendos)

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Fonte: BCB

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Fonte: BCB

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Fonte: BCB e IBGE

Acesso à creche: demanda oculta, judicialização e grupos mais prejudicados

1. Acesso

Nesta semana, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) publicou pesquisa sobre o acesso à educação dos brasileiros menores de quatro anos em 2015 . Naquele ano, apenas 26% das crianças de até três anos estavam matriculadas em creches, enquanto 46% das crianças não estavam matriculadas, embora os responsáveis desejassem obter uma vaga em creches públicas. Trata-se de uma evidência da inviabilidade de se atender a toda a demanda imediatamente, o que é admitido pelo Plano Nacional de Educação (PNE), cuja meta 1 – bastante ambiciosa, por sinal – é “ampliar a oferta de educação infantil em creches, de forma a atender, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) das crianças de até 3 (três) anos até o final da vigência deste PNE.”. Em 2015, isso significaria criar 2,5 milhões de vagas de creches, número próximo do total de crianças matriculadas nas redes públicas e privadas naquele ano (2,66 milhões).

Quadro 1: Acesso à creche da população menor de 4 anos

Creche integral (A)

14%
Creche meio período (B) 12%
Fora da creche (C = D+E) 74%
   Sem interesse (D) 28%
   Com interesse (E = F+G) 46%
       Não tomaram qualquer ação (F) 26%
       Tomaram alguma ação  (G = H+I+J+K) 20%
H)   Contato com creche, prefeitura ou secretaria para informações sobre           existência de vagas 12%
I)      Inscrição em fila de espera para vagas 7%
J)     Contato com parentes, conhecidos ou amigos que poderiam ajudar a conseguir uma vaga 1%
K)   Ação judicial solicitando uma vaga 0%

Fonte: IBGE

2. Demanda oculta

A dificuldade de obtenção de vagas em creches acaba desencorajando muitas famílias a procurar o poder público: 57% dos responsáveis com interesse em encontrar uma vaga em creche não havia procurado o poder público. Isso explica porque os municípios com maior oferta de vagas em creches também são os que têm maior demanda não atendida e indica que pelos próximos anos o aumento na oferta de vagas de creches não irá resultar em redução proporcional na demanda. Paradoxalmente, os gestores municipais que agirem com maior efetividade para ampliar as vagas em creches municipais serão ainda mais pressionados a ampliar a oferta de vagas, o que ficou bastante evidente no município de São Paulo nos últimos anos (Gráfico 1), conforme já expusemos neste Blog .

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Fonte: Secretaria Municipal de Educação (SME) de São Paulo

3. Judicialização

A educação infantil é organizada em creches (até 3 anos) e pré-escolas (4 e 5 anos). Embora a creche não seja etapa de ensino obrigatória (CF, art. 208, I), muitos juristas interpretam que o dever constitucional dos municípios de ofertar vagas para todas as crianças cujos responsáveis queiram matricular seus filhos em creches (CF, art. 208, IV e art. 2011, §2º) seja uma norma autoaplicável, levando alguns responsáveis recorrer ao Poder Judiciário. Trata-se de uma interpretação medíocre da aplicabilidade das normas constitucionais que dá aos integrantes do Ministério Público e Poder Judiciário a sensação de dever cumprido, mas, como visto no item 1, algo completamente desconectado da realidade operacional e orçamentária dos municípios.
Devido à demanda oculta, a judicialização também tende a punir os gestores municipais que criam mais vagas em creches. De fato, na região Sul, que possui o maior percentual de crianças matriculadas em creches, é a região com maior índice de responsáveis que buscam obter vagas pela via judicial (0,36%), índice de apenas 0,02% no Nordeste, região com menor acesso a creches. Ademais, a judicialização tem o efeito de priorizar famílias mais informadas sobre o acesso ao Judiciário, que não necessariamente são as famílias com maior necessidade da vaga. Neste sentido, a intervenção judicial deveria se dar apenas em ações coletivas motivada por omissão do poder público municipal em ampliar a rede municipal de educação infantil.

4. Maiores prejudicados: pobres e mulheres

O IBGE também constatou que o rendimento médio mensal domiciliar das famílias das crianças matriculadas em creches de período integral era de R$ 972, contra R$ 813 das crianças que passavam o dia em outro domicílio (eventualmente mediante pagamento) e R$ 550 das crianças que permaneciam o dia todo na própria casa. Conforme se pode observar no Gráfico 2, a demanda não atendida por creches é maior entre as famílias com renda domiciliar per capita inferior a 1 salário mínimo.

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Fonte: IBGE

Além disso, o déficit de vagas em creches é um problema que afeta principalmente mulheres: 83,8% das crianças tinha como principal responsável mulheres e apenas 16,2% homens. Isso ajuda a explicar as pesquisas que constatam que as mulheres despendam mais horas que os homens no trabalho doméstico . A proposta de equiparação da idade de aposentadoria de homens e mulheres devido ao diferencial salarial cada vez menor entre homens e mulheres e à maior expectativa de vida e de sobrevida das mulheres frequentemente é criticada devido ao fato que as mulheres são mais oneradas que os homens com trabalho doméstico. Do ponto de vista social, faria mais sentido manter os subsídios à aposentadoria feminina ou direcionar recursos para a ampliação da oferta de vagas de educação infantil, algo que tende a beneficiar proporcionalmente mais as mulheres que os homens?

Sobre a “pior crise da história”

  1. Os números do Produto Interno Bruto (PIB)

Há cerca de um ano, escrevi neste Blog que as expectativas para a economia em 2016 eram ruins, medíocres na melhor das hipóteses[1]. Infelizmente, não conseguimos atingir um resultado medíocre. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o PIB do Brasil caiu 3,59% em 2016, em linha com expectativas de mercado – em 06/01/2017, a mediana dos analistas consultados pelo Relatório Focus[2] esperava queda do PIB de 3,49%, 0,5% a menos que a expectativa no início de 2016[3]. Para 2017 se espera um crescimento de 0,49% do PIB[4], o que marcaria o fim da recessão, mas significaria o quarto ano consecutivo de queda no PIB per capita.

O que diferencia o atual período recessivo da economia brasileira é sua duração: o PIB trimestral vem se contraindo há 8 períodos consecutivos, resultando em queda do PIB de 7,2% entre 2015 e 2016, a recessão mais duradoura e profunda dos últimos 20 anos (Gráfico 1) e que tem contornos de depressão econômica.

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Fonte: IBGE

A Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), principal componente dos investimentos, caiu pelo terceiro ano consecutivo, acumulando queda de 25,9% entre 2014 e 2016 (Gráfico 2). Com isso, FBCF, que entre 2010 e 2013 foi maior que 20% do PIB, caiu para 16,4% do PIB em 2016, menor percentual dos últimos 20 anos.

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Fonte: IBGE

  1. A relação entre deflator do PIB e IPCA

Historicamente, a carga tributária tende a ser mais correlacionada com o deflator do PIB e as despesas públicas com o IPCA – os índices de preços aos consumidores são referência direta para a correção do salário mínimo, proventos previdenciários e, indiretamente, para reajustes do funcionalismo público. Ademais, após a promulgação da Emenda Constitucional 95/16, o IPCA passou a ser referência para o teto de despesas da União[5]. Portanto, um deflator do PIB maior que o IPCA contribui para um aumento no saldo primário.

Nos últimos 20 anos, o deflator do PIB só foi menor que o índice de Preços do Consumidor Amplo (IPCA) em 1999, 2000, 2002 e 2015, em geral anos de expressivas depreciações cambiais e correção de preços administrados. Em 2015, o deflator do PIB foi de 7,9%, contra IPCA de quase 10,7%, o que contribuiu para a deterioração do saldo primário naquele ano. Em 2016, o deflator do PIB foi de 8,3%, 2% a mais que o IPCA (Gráfico 3). Se o deflator do PIB continuar maior que o IPCA nos próximos anos, haverá uma contribuição positiva para a melhoria das contas públicas.

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Fonte: IBGE

  1. A crise atual em perspectiva histórica

Um aspecto implícito nas análises econômicas é que não basta que o PIB cresça, o PIB deve crescer mais que a população – se o crescimento do PIB for inferior ao crescimento da população, a economia se torna maior e ao mesmo tempo a população se torna mais pobre. Como no longo-prazo ocorrem mudanças demográficas, o PIB per capita é melhor que o PIB como indicador do ciclo econômico nas séries históricas mais longas. A população brasileira, que já chegou a crescer mais de 3% ao ano no final dos anos 50 e início dos anos 60, desde 2012 cresce menos de 1% ao ano. Um crescimento do PIB de 2%, que atualmente resulta em aumento do PIB per capita, representaria queda da renda per capita naquele período.

Entre 2014 e 2016, o PIB per capita caiu 9,1%. No final de 2016, o PIB per capita real era menor que o do final de 2010. A crise atual já é mais profunda que a crise de 29 (entre 1929 e 1931, o PIB per capita caiu 7,9%) e a crise acarretada pelo “confisco” do Plano Collor (entre 1990 e 1992, o PIB per capita caiu 7,7%), sendo superada em profundidade apenas pela crise da dívida externa, entre 1981 e 1983, quando o PIB per capita caiu 12,4% (Gráfico 4).

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Fonte: IBGE

Em perspectiva histórica, as duas primeiras décadas do século XX e os anos compreendidos entre 1981 e 2016 foram períodos de baixo dinamismo econômico: entre 1901 a 1919, o PIB per capita cresceu em média 0,9% ao ano, sendo esse crescimento concentrado na década de 10 (em 1910, o PIB per capita foi praticamente o mesmo de 1901) e, de 1981 a 2016, o crescimento da renda per capita tem sido ainda menor: 0,8% ao ano. Após a Primeira Guerra Mundial, o início do processo de industrialização impulsionou o crescimento econômico e, entre 1920 e 1931, a renda per capita aumentou em média 2,9% ao ano. O período mais dinâmico da economia brasileira ocorreu entre 1932 e 1980, quando houve deslocamento do eixo dinâmico da economia brasileira para o mercado interno e intenso processo de industrialização e urbanização. Neste período a economia brasileira foi uma das mais dinâmicas do mundo: a renda per capita avançou em média 4,1% ao ano, sendo multiplicada por 7[6]. Mesmo se considerarmos que as crises dos anos 80 e início dos anos 90 foram uma decorrência desse padrão de acumulação, entre 1933 e 1992 o PIB per capita avançou 3,2% ao ano. Desde a crise da dívida externa do início dos anos 80, o único período em que a economia brasileira teve crescimento econômico expressivo foi entre 2004 e 2013, quando o PIB per capita cresceu em média 2,9% ao ano. Como já ressaltamos neste Blog, períodos de queda na renda per capita tendem a estar associados a períodos de instabilidade política e queda de governos, como ocorreu em meados dos anos 60, 80, no início dos anos 90 e no ano passado.

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Fonte: IBGE

O Gráfico 6 apresenta a evolução da renda per capita em escola logarítmica – quanto mais inclinada a curva, maior o crescimento da renda per capita. Isso torna visualmente mais evidente a quebra estrutural a partir de 1981 e como o Plano Real e as políticas liberalizantes introduzidas a partir dos anos 90 não conseguiram recuperar as taxas de crescimento da economia brasileira.

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Fonte: IBGE

Planilhas com série histórica do PIB per capita: PIB histórico

[1] https://bianchini.blog/2016/01/14/expectativas-para-2016-ruim-mediocre-na-melhor-das-hipoteses/

[2] http://www.bcb.gov.br/pec/GCI/PORT/readout/R20170106.pdf

[3] http://www.bcb.gov.br/pec/GCI/PORT/readout/R20160108.pdf

[4] http://www.bcb.gov.br/pec/GCI/PORT/readout/R20170303.pdf

[5] https://bianchini.blog/2016/10/15/o-novo-regime-fiscal-e-as-vinculacoes-de-despesas-com-saude-e-educacao/

[6] http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/29092003estatisticasecxxhtml.shtm